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O negócio do futebol modificou-se de uma forma acelerada pela entrada de russos, chineses e árabes na modalidade. Esta situação levou, mesmo, a falar de uma alteração da geopolítica da bola.
Se a Rússia deixou de poder ser uma liga atrativa por razões evidentes, que a guerra da Ucrânia aprofundou, a China decidiu colocar algum travão ao desenvolvimento estrutural dos seus clubes, o que levou, também, a criar dificuldades ao seu investimento nos clubes das principais ligas europeias.
A chegada da liga saudita, com nomes sonantes do futebol europeu, está a alterar o modelo de abordagem ao negócio do futebol. Desde a formação até à alta competição tudo tem de ser pensado e articulado e, para isso, é preciso liquidez.
Não chega só ter o estádio, mas é preciso ter as estruturas de suporte, como as áreas de formação e estágio, centros médicos avançados, apoio profissional aos atletas e, aos que estão na formação, apoio académico. Tudo isto, com algumas dificuldades, tem sido desenvolvido um pouco pelas principais ligas europeias com reflexos nas respetivas seleções nacionais.
Portugal tem sido uma das principais ligas exportadoras de atletas, de técnicos e mesmo de gestores desportivos. Ao mesmo tempo tem sido uma liga que sabe recrutar noutros mercados na América Latina, em África e noutras geografias.
Vemos, entretanto, que a liga portuguesa não consegue gerar recursos financeiros para ter clubes sustentáveis e competitivos no xadrez europeu ou no internacional. Ninguém consegue atrair marcas globais para apoiar os clubes, comercializar o nome do estádio ou rentabilizar os direitos televisivos de imagem. Ainda hoje é possível observar comerciantes, em volta dos estádios, a vender camisolas ou cachecóis dos clubes que não estão licenciados.
Daí que muitos especialistas se interroguem sobre a sustentabilidade dos clubes portugueses numa liga onde, tradicionalmente, só três lutam pelos títulos. Aliás, esses clubes apresentam expressivos passivos nas suas contas.
Parece-me que estamos a chegar a um momento que vai ser preciso mudar o paradigma de abordagem ao negócio do futebol. Começando por trazer maior escrutínio às finanças dos clubes, maior transparência aos negócios gerados, regulação mais atenta. A arbitragem deverá ser independente em nome da segregação de funções. O comércio deverá ser como em qualquer negócio atento aos conflitos de interesse. O espetáculo deverá ser preservado de meios ou formas que não ajudam ao seu desenvolvimento e consolidação.
Portugal tem uma das melhores seleções de futebol do Mundo. Tem clubes que sabem formar dos melhores jogadores do Mundo porque não conseguimos ter uma liga atraente? Mudando o paradigma e alguma cultura de dirigismo, de certeza que evitamos ser o tal circo de que Cristiano Ronaldo falava.