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1. O país precisa de mais habitação. As pessoas precisam de casa para viver, a preços compatíveis com os níveis salariais. O problema é grave e mau tanto para as pessoas como para o desenvolvimento do país. É reconhecido pelo Banco de Portugal como impeditivo da atração e fixação de migrantes e de portugueses, qualificados e não qualificados, com impactos negativos na economia e na demografia. Há, portanto, consenso no reconhecimento do problema, na perceção de que ele é grave e antigo, e de que as soluções são muito difíceis. Porém, se as soluções são difíceis, a invocação da necessidade de perfeição torna um problema difícil num problema sem solução.
2. Se o que se deseja é uma solução eficiente e rápida, bloquear não é certamente alternativa. Vale mais ter um plano com eventuais insuficiências e defeitos, que podem ser corrigidos, do que não ter plano algum. Neste momento, a não aprovação do Mais Habitação prejudicaria sobretudo os que mais necessitam de casa. Todos os outros estão protegidos pela inação. Por isso, considero que os termos do debate público em torno deste tema têm sido muitas vezes cínicos e destrutivos, impedindo toda e qualquer solução mais do que promovendo soluções alternativas.
3. Um programa como o Mais Habitação reúne medidas que ferem interesses diversos, contraditórios e inconciliáveis: proprietários de imóveis que vivem de rendas, inquilinos ou pessoas que necessitam de habitação a preços adequados aos seus rendimentos, bancos e investidores em imobiliário que procuram maximizar os lucros, entre outros. Numa conjuntura de especulação de mercado, nunca obterá aprovação consensual. Pelo contrário, junta todos os que têm voz, em contestação, embora frequentemente por motivos opostos.
4. Ao lado do Mais Habitação, foram lançados programas robustos que estão a salvo destes bloqueios. São os quase 2400 milhões de euros do PRR em processo de contratualização e transferência para as autarquias, cooperativas e privados para que construam casas. Esses programas poderão provocar um impulso decisivo. Dependem, sobretudo, da capacidade de concretização, de planeamento e execução das instituições envolvidas. Terão, por isso, um sucesso desigual, mas essa “imperfeição” não impedirá o seu contributo para a resolução do problema da habitação em Portugal.

