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Fez 98 anos, há dias, a data do aniversário de nascimento do antigo presidente da República Mário Soares. A memória do seu legado continua viva naquela que é a nossa experiência de vida democrática. Representou uma forma de fazer política onde a convicção ganhava espaço a cada momento na sua ação. Era alguém que compreendida a velha máxima de Max Weber de que a política só se faz com vocação ou como profissão. Soares escolheu a vocação. Tinha intuição e uma forte cultura de saber fazer política. Protagonizou muitos momentos decisivos da nossa vida coletiva. Antes do 25 de Abril destacou-se, na luta ao Estado Novo, como líder da Oposição democrática. Depois da revolução, liderou o combate ao gonçalvismo. Protestou contra os exageros do 11 de Março, combateu a unicidade sindical e soube enfrentar Álvaro Cunhal no célebre debate televisivo. Esteve no 25 de Novembro para permitir que o 25 de Abril pudesse continuar e afirmar-se como uma democracia parlamentar.
Com Francisco Sá Carneiro criou a saudável rivalidade que levou à existência de dois partidos cuja matriz, na época, era muito semelhante na ocupação do mesmo espaço - o centro político.
Foi primeiro-ministro na fase inicial da institucionalização do regime constitucional. Conseguiu ser presidente da República, após a última grande disputa eleitoral, contra Diogo Freitas do Amaral. No dia seguinte era o presidente de todos os portugueses. A sua capacidade residia em saber ouvir e juntar , sem ter de mudar de ideais ou convicções. Lembro-me de vários momentos que com ele convivi. A deslocação a Praga, na tomada de posse de Havel, e a oportunidade que tive de aprender com ele. Os encontros com a Comissão Parlamentar de Defesa num dos momentos mais críticos sobre a organização das Forças Armadas ou a sua preocupação com o meu acidente na sequência da visita do presidente José Eduardo dos Santos.
Como pai fundador da nossa democracia vão coincidir no tempo, em 2024, as comemorações dos 50 anos do 25 de Abril e os 100 anos do seu nascimento.
Penso que seria o momento e a oportunidade para lhe erguer um memorial no Porto que possa lembrar o seu papel decisivo na História de Portugal. Deixo aqui o desafio de se criar uma comissão, para angariar os meios necessários para essa homenagem do povo do Porto, cujo código genético se identifica com Mário Soares no seu gosto pela liberdade porque, como ele nos dizia, só perde quem desiste de lutar. Num tempo em que muitos dos seus camaradas parecem não ter a sua capacidade de compreender as mudanças do Mundo não nos podemos esquecer do seu legado que já é nacional.
*Professor universitário de Ciência Política