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Lá para o ano de 1938, mais concretamente em 29 de setembro, Munique representou o esforço de se evitar um novo conflito na Europa. Então, Neville Chamberlain, primeiro-ministro inglês, exibia com agrado o magro resultado de um acordo com cedências à Alemanha nazi para garantir a paz na Europa.
Benito Mussolini e o primeiro-ministro francês, Édouard Daladier, serviram só de testemunhas de um ajuste que entregava à Alemanha o território dos Sudetas. Muito longe, os Estados Unidos evitavam comprometer-se no conflito. A 1 de setembro de 1939, Hitler invadia a Polónia e começava a II Guerra Mundial.
Os Estados Unidos iriam esperar pelo ataque japonês a Pearl Harbor, a 7 de dezembro de 1941, para decidirem a sua entrada na guerra depois, como Roosevelt lhe chamou, do Dia da Infâmia. Estaline tinha sido o aliado de Hitler que resultou na assinatura do pacto Molotov-Ribbentrop.
Em 1945, os europeus e os Estados Unidos criaram uma nova ordem mundial. A ordem mundial liberal que acreditava em valores partilhados e cuja maior construção foi a NATO.
Durante 80 anos, americanos e europeus caminharam juntos, enfrentando a Guerra Fria, na defesa dos mais elementares valores do Estado de direito e da democracia.
Agora, de novo, em Munique, numa conferência sobre a segurança, os americanos parecem dizer à Europa que esta ordem mundial terminou com a saída do presidente Joe Biden. O novo vice-presidente, JD Vance, deixou esse recado, desde logo, excluindo os europeus da mesa das negociações e tratando a Ucrânia como uma coisa menor no diálogo EUA e Rússia. Esquecem é que o sangue derramado por imensos soldados americanos nas praias da Normandia não foi em vão. Uma lição todos nós aprendemos. Os Estados Unidos, sem os seus aliados europeus e sem o Canadá, não sairão vencedores de uma guerra, seja ela comercial ou não, contra os BRICS.
Ao procurar o diálogo diretamente com Putin, o presidente Trump está a renegar o papel consensual dos Estados Unidos na defesa do mundo livre.
A iniciativa do presidente Emmanuel Macron de convocar uma cimeira com outros líderes europeus, do Reino Unido, Alemanha, Polónia, Espanha, Holanda e Dinamarca, parece ser a resposta necessária para quem quer defender a liberdade da Ucrânia. Aliás, o primeiro-ministro Keir Starmer já veio evidenciar a disponibilidade do Reino Unido de enviar tropas para a Ucrânia.
Resta à União Europeia assumir a liderança do continente europeu e preparar-se para uma nova ordem que vai implicar decisões estratégicas nas áreas comercial e de defesa. Para isso vai ser necessária coragem política e opiniões públicas esclarecidas no apoio aos governos democráticos. O perigo das ideias de extrema-direita não podem agora serem ignorados.
Como diria Karl Marx, a história repete-se sempre, primeiro como tragédia e depois como farsa. Estamos nesse novo tempo.