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E ao enésimo episódio da novela orçamental, o país suspirou de alívio, sobretudo o país mediático, que andava a dormir mal, dado que o outro, o real, seguia enfadado com tanta tensão dramática. Felizmente que imperou o bom senso e não se lançou a estabilidade para o ralo. Pedro Nuno Santos foi arrastado para uma posição híbrida de que nunca foi grande entusiasta, mas fê-lo também a pensar na sua sobrevivência. Aos olhos dos portugueses e dos camaradas socialistas.
Naturalmente que há quem consiga construir cenários extremamente complexos em torno das decisões políticas, mas neste caso o puzzle tem poucas peças: ou o PS salvava o Orçamento do Estado ou mergulhávamos de novo numa crise política cuja banda sonora principal teria como maestro André Ventura e os seus bem-mandados soldados de plasticina. O Governo estava refém do PS e do Chega e foi salvo à 25.ª hora pela ala moderada do Largo do Rato.
Não é de esperar, todavia, que o impasse das últimas semanas se transfira para o debate na especialidade, ainda que o PS vá querer exibir algum do ascendente negocial agora conquistado. Importa, sobretudo, olhar de forma desapaixonada para as lições a tirar deste folhetim: a previsível aritmética parlamentar dos próximos anos vai obrigar a cedências das partes e, nesse sentido, era desejável que todos tivessem aprendido um pouco, privilegiando a antecipação dos danos em vez da contabilização dos estragos. É natural e desejável que os partidos divirjam e se distingam, mas a onda de extremismo que está a varrer a Europa obriga os moderados a refletir sobre a real dimensão dos seus umbigos políticos. Tanto taticismo só pode correr mal.