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6 de junho de 1944. 6 de junho de 2024. Entre estas duas datas medeiam uns simples e longos 80 anos.
Não deixa de ser emblemático que esta comemoração surja num momento em que a Europa, resultante desse esforço de imensos homens e mulheres, militares e civis, nesse dia, vá agora a votos. Naquele longínquo dia, as forças armadas dos EUA, do Canadá, da Inglaterra, as forças livres da França e de outros movimentos de resistência atravessaram o Atlântico para desenvolverem uma grande ofensiva para libertar a França e a Europa do jugo nazi e da influência das potências do Eixo.
Oitenta anos depois, a Europa vive, de novo, em guerra na fronteira da Ucrânia com a Rússia, vê alguns estados europeus próximos dessa mesma fronteira membros da União e da NATO a serem, em simultâneo, ameaçados.
A Europa que se libertava com o Dia D sublinhava a importância da aliança do mundo ocidental, das sociedades democráticas, abertas, participativas, e o seu contributo para uma nova ordem mundial.
Com esse desembarque, começava a construir-se o embrião de uma ideia europeia que demorou ainda cerca de treze anos, até 1957, a materializar-se na forma de uma comunidade económica europeia. Contudo, demorou só cerca de cinco anos, em 1949, a institucionalizar-se a ideia de uma aliança militar onde o princípio da solidariedade, previsto no artigo 5 do tratado fundador da NATO, deixava claro que o ataque a um será interpretado como um ataque a todos.
Ora, hoje a nossa Europa confronta-se com um teatro de guerra que parece querer escalar para outros domínios, com um grande esforço de coesão económica e social.
Esta imagem da invasão da Normandia lembra-nos o perigo de se repetirem os erros e de querer viver o mesmo passado.
Naquelas praias, foram derrotadas as ideias do extremismo, das ditaduras e dos nacionalismos. Agora parece que o génio do mal, que se guardou naquela garrafa, está a tentar libertar-se para nos voltar a atormentar, nos nossos dias, negando aquilo que considerávamos conquistas da nossa civilização.
Poderá existir uma nova geometria no Parlamento Europeu com a chegada de forças mais extremistas e com discursos mais populistas. Essa nova geometria vai precisar de forças moderadas que, ao centro, encontrem os consensos necessários para se continuar a defesa do Estado social e dos valores democráticos que o sangue derramado naquelas praias da Normandia evidenciou.
Os soldados que vieram dos quatro cantos do Mundo para lutarem e morrerem pela liberdade e pela dignidade humana não iriam compreender o estado em que se encontra hoje a nossa Europa.