Tenho para mim que o Estado, enquanto forma de organização coletiva de referência, tem que ser e dar o exemplo. Deve ser o espelho de todos nós. Do melhor que há em nós.
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Sabemos bem que não tem sido assim. Não é, quero crer, o melhor de nós que aí vemos espelhado e o exemplo, na maioria das vezes, não deve ser seguido.
De imediato, identifico uma situação em que muito tínhamos a ganhar se o exemplo vindo do Estado e dos poderes públicos fosse outro: o pagamento a tempo e horas aos fornecedores.
Concedendo, sem grande dificuldade, que as coisas já terão estado piores e que são visíveis, de quando em vez, esforços bem-intencionados de pôr cobro a este flagelo, a verdade é que a realidade é má.
Interrogo-me sobre se haverá vantagens na persistência desta prática, e não as encontro. Não encontro também razões de peso que justifiquem este estado de coisas, a não ser o estado a que deixámos isto chegar.
Por outro lado, encontro um enorme rol de desvantagens. Desde logo a mensagem que passa de falta de rigor e de respeito por parte de quem deveria estar na liderança dos bons exemplos.
Os homens da troika, quando por cá estiveram, no princípio da década anterior, entre as coisas menos e mais acertadas que nos impuseram, a preocupação com o cumprimento dos prazos de pagamento estava claramente no segundo grupo. Mas também só tiveram alguns sucessozitos fugazes e pontuais. Estavam a lutar contra uma instituição nacional!
Na Saúde este é tema recorrente com um folclore a que nos fomos habituando de ciclicamente surgir um providente bodo aos pobres que regulariza os saldos em dívida, para pouco depois tudo ficar mais ou menos na mesma.
É inaceitável e os custos de contexto que esta ineficiência coletiva gera são um entrave à saúde da economia e à economia da saúde. Julgo que isto não tem que continuar a ser uma fatalidade, a que, com mais ou menos contestação, nos resignamos.
Para um problema grave, precisamos de medidas drásticas e a que me vem de imediato à cabeça, inspirada em parte no que sucedeu ou sucede noutras paragens, passa por tornar automático, e independente da sua vontade ou iniciativa, o pagamento ao fornecedor de juros de mora pelos dias de atraso nos pagamentos, aplicando-se uma taxa dissuasora para o efeito. Qualquer coisa como 10% ao mês.
Como eu gostava de ter um Estado e poderes públicos a darem os bons exemplos, a serem a referência. Que efeito mobilizador no nosso desenvolvimento e consequentemente no nosso crescimento esta mudança, que não custa muito dinheiro, poderia operar. Era bom mas, entretanto, acordei.
*Diretor-executivo do Health Cluster Portugal