As últimas semanas deixaram-nos com muitas dúvidas e mais interrogações.
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Primeiro, por causa do relatório da Comissão Independente sobre os abusos sexuais na Igreja. As suas conclusões não deixam de lançar um enorme desafio, em Portugal, à Igreja Católica. Será preciso refletir nas suas conclusões e não ter medo de ir até às últimas consequências, sejam elas criminais ou éticas. Nada fica igual a partir de agora. O que se revelou é demasiado cruel para ser verdade.
Depois, com a apresentação, por parte do Governo, da sua política para a habitação. Quando se esperava que viesse a surgir uma política pública sustentável e com capacidade para ser implementada, os 900 milhões podiam ajudar a isso, eis que o Governo opta por se transformar em senhorio e também inquilino ao encontrar uma solução que parece que não agrada a ninguém.
O que seria de prever era voltar a uma intervenção corretiva no mercado habitacional, através das autarquias, que permitisse lançar habitação a preços de arrendamento acessíveis. Se, no Estado Novo, as rendas habitacionais foram uma forma de controlar a inflação e os baixos salários, hoje a intervenção do Estado deveria ser consubstanciada em programas de construção, apoiados em fundos públicos, cuja contrapartida seria a existência de rendas acessíveis, evitando criar entropias no mercado.
Neste esforço, as misericórdias de Portugal poderiam entrar e dar um contributo social para este problema. Como aliás aconteceu nos anos 90, construindo e arrendando fora do mercado especulativo. O documento entra agora em discussão pública, esperemos que fique melhorado.
Uma terceira nota sobre as polémicas da política de imigração. Num país onde a demografia se transformou num grave problema estrutural, torna-se inevitável encontrar uma solução para a fuga de jovens talentos e para os baixos salários que já não motivam muitos portugueses. Não falamos de uma solução conjuntural, mas antes de uma solução que precisa de ser bem definida naquilo que se considera como as necessidades estratégicas da economia portuguesa. Entretanto, assistimos a vários dirigentes do PSD dizerem tudo e o seu contrário, com o presidente a chamar à atenção dessas contradições.
Finalmente, a agitação social de que a greve dos professores parece ser um exemplo mais ilustrativo. A grande defesa da escola pública teve como resposta do primeiro-ministro que não há dinheiro para pagar as reivindicações dos professores. Aqui chegados, citando Lenine, que fazer? Talvez procurar compreender porque é que o ensino particular e cooperativo estão, cada vez mais, a ser complementares ao atual modelo educativo.
*Professor universitário de Ciência Política