O Orçamento e a ideologia do acordo
Os tempos que correm obrigam-nos a estar atentos ao desenvolvimento da ação política. O senhor presidente da República avaliou e desenhou os cenários que a não aprovação do Orçamento do Estado implica. Isto é, se não existir geringonça, vamos para eleições antecipadas.
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Ao mesmo tempo, a oposição de Direita entrou em convulsão. Sem se compreender o objetivo, quer Rui Rio quer Francisco Rodrigues dos Santos acenaram com uma crise política para adiarem os respetivos processos eleitorais internos.
As consequências mostraram como estavam errados porque todos já compreenderam que o atual ciclo político está a esgotar-se.
Agora, quer o PSD quer o CDS vão fazer congressos e entrar em plural debate interno. Os candidatos, da oposição interna, vêm curiosamente do Parlamento Europeu.
De qualquer forma, é positivo este agitar de águas na Direita portuguesa. Do lado do PSD existe uma linha vermelha a não esquecer. Não se pode perder o eleitorado de centro-esquerda, aquele que Rui Rio estava a recuperar. À Direita, a luta, como é natural, irá endurecer. A Iniciativa Liberal e , principalmente, o Chega, para não perder eleitores, vão ser mais agressivos.
À Esquerda, é a velha máxima do "agarrem-me senão mato-o". Quer o PCP quer o Bloco sabem que perdem mais porque, no final, após eleições, podem ficar mais fragilizados.
No meio disto tudo, e com um Orçamento de fazer de conta, como tem sido nestes últimos seis anos, todos sabemos que o mesmo se transformou num troféu para consumo interno dos parceiros do PS.
Aprovado pelo Parlamento não é para ser cumprido graças à política de cativações que Leão irá implementar.
Fica, então, a dúvida se não será o próprio António Costa a querer provocar uma crise política para apanhar os partidos de Direita em contramão e, ao mesmo tempo, livrar-se dos partidos da geringonça.
Pode ser uma visão digna de Nicolau Maquiavel, mas não pode deixar de estar em cima da análise política.
Como dizia o professor Salazar "em política o que parece é" e o recente acordo a propósito da Câmara do Porto mostra que não existem impossíveis em política.
Aplica-se a esta crise política aquela frase da senhora Thatcher "o inesperado acontece sempre, o inevitável nunca acontece"?
Estamos em tempo de ideologia do acordo e, citando o padre António Vieira, "nenhuma coisa se pode prometer à natureza humana nem mais conforme ao seu maior apetite, nem mais superior a toda a sua capacidade, que a notícia dos tempos e sucessos futuros".
Vamos aguardar pelos próximos episódios.
*Professor universitário de Ciência Política