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Que belas são as cidades que também se podem definir a partir dos telhados. Sobretudo se não são apenas construídos para se constituírem como simples cobertura. Por exemplo, na cidade do Porto, a luz matinal ignora as janelas e entra, freneticamente, pelas claraboias, como se fossem vitrais de igrejas góticas. A claraboia é um elemento iconográfico das casas históricas do Porto, apresentando-se de variadas formas, múltiplos feitios e diferentes modelos.
Perante os telhados aparentemente iguais, cada claraboia introduz um desenho, uma identidade arquitetónica, uma imagem, uma cor, uma patine diferente e única. Por isso, no Porto, não há nenhum telhado igual. Trabalhadas ou toscas, modestas ou grandiosas, com ou sem remates de ferro trabalhado e vidro colorido, estas são as minhas musas, vistas do céu, onde parecemos estar quando olhamos a cidade a partir do morro da Sé, do cimo da Torre, ou do último piso do saudoso edifício do JN.
É surpreendente escutar, com o olhar, o diálogo entre elas e com as imensas torres provindas do céu da cidade. Algumas são decoradas com adornos feitos pela leveza deste granito, como se fossem vestidos de mulher, em dias festivos.
E porque se construíam estes elementos arquitetónicos? Porque no centro histórico do Porto predomina o lote gótico, constituído por frentes de rua muito estreitas e de grande profundidade. E este rasgo, no seu interior, era a única forma de permitir a entrada de luz no edifício, iluminando de forma natural o vão de escadas, à volta do qual a casa, normalmente burguesa, se organizava.
Gosto das claraboias do Porto. E se a boia nos salva no mar, a claraboia salva o edifício na cidade. Porque sem luz, não há vida, nem cidade.