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Na generalidade dos ecossistemas com que convivemos, e em particular nos mais complexos, deveria ser de elementar constatação que as pessoas, ou, como agora chamamos, os recursos humanos, são estruturantes à sua função e atividade. Estou a pensar, desde logo, nos hospitais, nas universidades, nas empresas e na ampla teia de entidades da administração pública. Estou ainda a pensar nas associações e nas coletividades, sejam estas de bairro ou de âmbito mais alargado.
No entanto, no que respeita à valorização e à hierarquização do seu papel enquanto fator chave do sucesso e do bom desempenho desses ecossistemas, são grandes as minhas dúvidas quanto à apreciação que coletiva e generalizadamente fazemos. Isto é, não estou nada convencido de que seja uma constatação, muito menos elementar, que este não é só um fator, mas antes o fator mais relevante e mais importante: o que faz a diferença.
É verdade que na literatura e no discurso, a primazia das pessoas e a proclamação da relevância, importância e centralidade do seu papel nas estruturas onde trabalham surge evidente e abundante. Apesar disso, na prática, nas políticas e nas ações concretas, aparentemente, tal nem sempre se verifica. Porventura, porque não sabemos como o fazer, porque estamos amarrados a conceitos e constrangimentos anacrónicos, porque a tática se sobrepõe à estratégia, ou porque estes ecossistemas, com o tempo, se vão degradando.
Por outro lado, se olharmos em volta - na nossa terra, no nosso país, ou no Mundo -, as empresas, as universidades, e os hospitais com melhores resultados são invariavelmente aquelas ou aqueles onde as pessoas que aí trabalham veem o seu mérito reconhecido, são mais bem tratadas e respeitadas, são mais bem remuneradas e são certamente mais felizes.
Tomemos a área da saúde e, desta, a densa rede associada à prestação de cuidados, onde têm lugar, desde os mais pequenos centros de saúde, até aos maiores e mais diferenciados hospitais, passando por uma grande diversidade de prestadores de serviços de diagnóstico. Não precisamos de ir mais longe para encontrar o acima exposto: com efeito, não será coincidência que as estruturas com melhores resultados e melhor desempenho sejam aquelas onde foi possível implementar uma gestão moderna e eficaz dos recursos humanos. Onde quem lá trabalha apresenta elevados níveis motivacionais.
Claro que na saúde as pessoas estão, ou deveriam estar, desde logo, no centro, porque são elas o fim comum e último de cada uma destas estruturas. Mas não é esse o ângulo que hoje quero abordar. Não o das pessoas que são o fim, mas o das pessoas que são o meio. As pessoas que fazem com que aconteça e assim os fins possam ser alcançados.
Dito isto, julgo que explode como evidente que este é o ponto que precisa urgentemente de ser trabalhado para respondermos à crise do nosso SNS porque, de facto e gritantemente, é aí que as pessoas que trabalham na saúde são menos bem remuneradas, menos bem tratadas e respeitadas, e onde o seu mérito não é alvo de reconhecimento. E, por isso, não são, manifestamente, felizes.
Desgraçadamente, não me lembro de ter visto, há já muitos anos, ações consistentes e de relevo no sentido de mudar este estado de coisas. Os resultados, esses, vemo-los todos os dias!