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Pela primeira vez, tive a curiosidade de ir ver a definição de mãe no dicionário. “Mulher que deu à luz um ou mais filhos”, lê-se na Infopédia. Confesso a minha desilusão. Se tivesse voto na matéria, sugeriria algo assim: “Mulher omnipresente e omnipotente, mestre do multitasking, ser sobre-humano.” Bem sei que sou suspeita, mas parece-me que o caso justifica o tom hiperbólico.
Ainda recentemente, num debate televisivo sobre os 50 anos de Abril, Tânia Graça, psicóloga clínica e sexóloga, lembrava isto: “As mulheres continuam a fazer três vezes mais tarefas domésticas, sendo isto particularmente visível quando há filhos, em que em todas as tarefas - médico, acordar à noite para ir ver a criança, levar a criança à escola - fazem três vezes ou mais.” A chamada de atenção é pungente. E ainda assim não vai ao detalhe. As noites a fio sem dormir, as viroses sem-fim (que obrigam os pequenos a ficar em casa, que ainda tornam as noites mais difíceis, que tantas vezes nos apanham também e tornam esta já difícil gestão um exercício de trapézio sem rede - já para não falar nos casos em que há problemas de saúde mais perenes), o regresso ao trabalho em modo zombie, mas com a mesma exigência de sempre, as lides da casa, por muito que haja cada vez mais homens a assumi-las também. E a arte de, no meio deste pequeno caos, reservar infinitas doses de paciência e amor para os nossos rebentos.
Há uns dias falava com uma mãe de uma bebé de meses, investigadora e professora universitária, que me contava isto: como teve um trabalho grande para entregar, andou semanas a deitar a filha pelas 21h e a adiantar trabalho das 21h às 2h. A partir das 4h, a bebé começava a acordar e ela já pouca dormia, durante o dia tinha as aulas para dar, o fim da tarde era reservado para a garota, porque disso não abdicava. Ainda hoje não sabe como aguentou. “Instinto de sobrevivência”, concordámos. E como é que o mercado de trabalho agradece? Com uma disparidade gritante. Em Portugal, enquanto os homens, depois de serem pais, veem o salário aumentar, em média, cerca de 15%, os das mulheres estagnam. Escusado será dizer que nada disto belisca o amor megalómano que temos às nossas crias. Mas podemos conformar-nos com esta discrepância atroz? Não, não podemos. Não precisamos de estatutos de donas de casa nem de retrocessos nos nossos direitos. Precisamos de mais. Mais direitos, mais incentivos, mais valorização salarial, mais empatia. De uma sociedade que não assuma que, quando damos conta de tudo, não fazemos mais que a nossa obrigação. Queridas mães, já vos disseram hoje que são incríveis?