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Uma das consequências da, no meu entender, excessiva e artificial mediatização de tudo o que tenha a ver com a prestação de cuidados de saúde, é a perceção generalizada de que se trata de uma dinâmica exclusivamente do lado da despesa. Da despesa do Estado, que nos toca indiretamente a todos, e da despesa das famílias, na sua implicação direta nos nossos orçamentos domésticos. Em Portugal, esta última anda na casa dos 30%, o que constitui, infelizmente, um peso muito elevado quando a comparação é feita com a generalidade dos países europeus.
A saúde tem, de facto, uma componente de despesa com cada vez maior significado na realidade orçamental, mas tem também um lado de receita e, sobretudo, de motor do desenvolvimento económico e social, que importa não deixar que seja ofuscado por visões mais míopes. É, precisamente, nas sociedades mais desenvolvidas e nos países com nível e qualidade de vida mais elevados onde as indústrias da saúde apresentam maior dinamismo e uma contribuição mais acentuada para a geração da riqueza coletiva.
Assumindo a Saúde, cada vez mais, um papel central nas nossas preocupações, desde logo porque é parte essencial da qualidade de vida a que conseguimos chegar e que ainda, e muito bem, queremos melhorar, importa assegurar um balanceamento equilibrado entre as suas vertentes de despesa e de receita.
Para isso muita coisa terá de mudar, e rapidamente. Os paradigmas que nos guiaram nas últimas décadas - uma resposta estruturada nos hospitais e orientada aos casos agudos -, terão de evoluir para novas abordagens - com aposta na prevenção e na valorização dos estilos de vida, suportada na massificação da digitalização e da utilização inteligente dos dados. A manter e a aprofundar: a fundamentação na ciência e a colocação do cidadão/doente no centro de todo o sistema.
Procurando traduzir em números esta dinâmica no nosso país, e tomando o ano de 2023, a despesa corrente em saúde ascendeu a 26 mil milhões de euros. Por outro lado, o setor (englobando produtores, distribuidores e prestadores) apresentou um volume de negócios que terá ultrapassado os 42 mil milhões de euros, gerando um valor acrescentado bruto (VAB) superior a 14 mil milhões de euros, o que representa cerca de 6% do PIB nacional, e empregando mais de 430 mil pessoas, o que corresponde a 9% do emprego nacional. Mais de 50% destas pessoas tinham formação superior. Em termos de exportações, no ano em referência, atingiu-se um máximo histórico de 3,3 mil milhões de euros.
Acresce, e esta é, sem dúvida, a parte mais interessante de toda esta história, o enorme potencial de crescimento que todo o ecossistema nacional da saúde evidência: nos bons resultados conseguidos pelas nossas universidades e pelos seus institutos de investigação, no bom desempenho do sistema nacional de saúde - onde a margem para ganhos de eficiência é elevada -, e na performance do tecido empresarial, onde os casos de sucesso na internacionalização começam a ganhar escala.
O que falta então para fazer explodir este potencial? A boa notícia é que o tema está mais do que estudado e é muito grande o consenso quanto ao caminho para lá chegar e quanto ao que falta fazer e por quem. A menos boa, é que a cultura antiempresa vigente, maldição que nos assola há tempo demais, não o tem permitido e perante isto: a luta continua!