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Trump ganhou as eleições. E agora? Agora, são mais as dúvidas do que as certezas que podemos ter, dado o caráter errático do novo presidente dos EUA. Há quem diga que foram as eleições mais importantes deste século. Ainda estamos nos anos 20, mas creio que estes resultados marcarão o futuro da América, da Europa e do Mundo para além dos quatro anos do mandato que se iniciará em janeiro de 2025.
Venceu, nestas eleições, o pior que existe no mundo da política democrática. Não podemos desvalorizar a fanfarronice, os insultos, o desrespeito pelas instituições, as ameaças, as mentiras, o negacionismo, a rejeição da ciência e do conhecimento. A ideologia e a visão do Mundo que subjazem a este modo de fazer política têm muitos mecanismos de difusão, de replicação, difíceis de contrariar. São ideias que se afirmam apesar dos desastres que provocam, que se difundem mesmo perante a evidência dos erros e das falsificações. Como vão as forças democráticas e humanistas encontrar um caminho de recomposição?
A vitória foi muito expressiva, clara e inequívoca, mas não esmagadora. Os EUA continuam a apresentar-se como um país dividido ao meio, metade democrata metade republicano. Metade Trump, metade Harris. Na história dos EUA, há muitas décadas que é assim, mas não há memória recente da anunciada concentração de poderes numa das forças, pelo menos no plano federal: a Presidência, o Senado, a Câmara dos Representantes e o Supremo Tribunal. Como vai funcionar o equilíbrio de poderes que tem sido uma das forças da democracia norte-americana? Ficará dependente dos equilíbrios entre Washington e os estados?
A redução da abertura da economia norte-americana ao Mundo, com a anunciada política de protecionismo, a desregulação dos mercados ou o retraimento da intervenção reguladora do Estado como irão afetar as relações com a União Europeia? O debate, ao longo da campanha eleitoral, sobre a guerra na Ucrânia e no Médio Oriente deixou em aberto todas as possibilidades. Paz na Ucrânia em troca da cedência a Putin dos territórios já ocupados? Carta branca aos primeiro-ministro de Israel na guerra em Gaza?
O discurso de vitória foi o de um guerreiro cansado e feliz por ter alcançado o que sempre desejou: ser o presidente dos EUA. Como foram vários os sinais de que isso lhe basta, que o trabalho de “corrigir” a América, de a “curar” e de a tornar “grande” de novo será entregue a alguns dos que o apoiaram e o seguiram, ajudando-o a vencer: Musk, Vance e Kennedy, entre outros, tão ou mais tenebrosos do que o seu chefe. Espero estar a ser pessimista.