Em três dias, quatro vítimas no Douro. Depois de André e António, dois irmãos de Gaia, de 18 e 20 anos, terem desaparecido em Oliveira do Douro, ontem, em Gondomar, Tiago, 22 anos, e Marco, de 30, afogaram-se na praia da Lomba e em Ribeira de Abade. Tiago foi resgatado. Os corpos dos outros três serão procurados esta segunda-feira no rio que, apesar de perigoso, não afasta banhistas.
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"Ele benzeu-se e atirou-se logo, calçado e tudo", contava Cláudio, ainda no areal da praia de Ribeira de Abade, Valbom, Gondomar. Uma hora antes, às 16.45 horas, Marco tinha-o desafiado para o banho. "Já não venho cá há cinco anos. Vamos nadar até ao outro lado". Cláudio disse que não. "Então, vamos ali até à boia amarela", reformulou Marco. Cláudio até ia aceitar, mas a namorada agarrou-o pela cinta e não o deixou ir. "Estiveste a beber cerveja e não sabes nadar para isso", justificou ela.
Cláudio ficou em terra. Marco foi na mesma e conseguiu nadar até à boia, que fica a uns bons metros de distância da margem. Foi no regresso que as coisas se complicaram. "Ele começou a ficar aflito quando estava a voltar e foi quase logo ao fundo", dizia Cláudio, ainda em choque.
"Eu não sei nadar muito bem, senão tinha ido atrás dele. Se fosse, podia ter lá ficado também", explicava o amigo. Cláudio ainda conseguiu avisar o irmão mais novo de que Marco "estava à rasca, mas ele disse que não era nada. Ele volta já..." Porém, Marco não voltou.
"É o terceiro amigo que vejo morrer à minha frente. Nunca mais ponho um pé no rio", jurava Cláudio, à beira das lágrimas. Ao lado, o irmão do meio de Marco ainda olhava para as buscas, mas já sem muitas esperanças. "Este rio é falso, muito falso", dizia.
Ao local, que não é uma zona balnear, mas que é utilizado como tal por muitas dezenas de pessoas sempre que faz calor, acorreram mergulhadores dos Sapadores de Gaia e dos Voluntários de Valadares, bem como elementos dos Voluntários de Areosa-Rio Tinto, da Polícia Marítima e do INEM. Ao final da tarde, ainda estavam dezenas de pessoas na praia. A mãe de Marco tinha sido alertada para o sucedido e, entretanto também tinha chegado. O irmão mais novo estava com ela, para a confortar.
Apesar dos esforços dos mergulhadores, o corpo de Marco ainda não tinha sido encontrado ao final da tarde. As buscas foram suspensas ao pôr-do-sol. São hoje retomadas.
"Não chegámos a tempo e o corpo desapareceu"
Era a primeira vez que o grupo de amigos de Canelas, Gaia, ia para a praia da Lomba, Gondomar, e, por isso, todos estavam, ontem, em choque com o afogamento de Tiago Alves, 22 anos. De acordo com Frederico Silva, 23, seu amigo, o acidente aconteceu pouco depois de terem chegado ao areal.
"Mal chegámos à praia, decidimos ir à água, deviam ser umas 11.30 horas. O Tiago decidiu ir nadar até às boias e, por isso, estava mais afastado de nós. Quando regressava para terra, vimos-lhe os braços no ar, mas achamos que estava a brincar. Da segunda vez, percebemos que estava aflito e fomos disparados ter com ele, mas não chegámos a tempo e o corpo desapareceu", contou, ao JN, o amigo, visivelmente abalado.
Três horas depois, o corpo foi resgatado por mergulhadores, próximo do local onde havia desaparecido. Ainda assim, só às 17.30 horas, é que o corpo foi retirado de um bote da Polícia Marítima, tendo os bombeiros transportado a vítima para o Instituto de Medicina Legal do Porto.
Segundo o relato dos amigos, de nada valeu o esforço dos nadadores-salvadores que vigiavam a praia.
Deu os parabéns à amiga
Logo pela amanhã, antes de sair para a praia, Tiago enviou uma mensagem de parabéns à amiga, Ana Morais, que ontem fazia 20 anos. E como Ana morava a cerca de cinco minutos da casa de Tiago, foi para ela que Frederico ligou a pedir que avisasse os pais do amigo para o sucedido.
"Quando me ligaram, nem queria acreditar no que tinha acontecido", disse Ana, inconsolável por ter perdido o "melhor amigo" no dia dos seus anos. "Nunca vou conseguir esquecer este dia", desabafou.
Os pais de Tiago, Francisco e Alexandra, não estavam em casa e só com "muita insistência" de Ana é que acederam ir ao seu encontro. "Não fui capaz de lhes dizer o que tinha acontecido ao Tiago, só contei que tinha tido um acidente e que precisam de ir, com urgência, para a praia da Lomba", referiu a amiga.
Só chegados à praia da Lomba, com o aparato de meios de socorro, é que Francisco e Alexandra se aperceberam da gravidade do sucedido. "Ai meu rico menino!", gritava a mãe, que teve de receber apoio psicológico.
Também Marina, 23 anos, que estava no rio quando Tiago desapareceu, confessou, em lágrimas, que ainda ouviu o amigo a gritar: "Ajuda-me!". Era unânime no grupo que "o possível cansaço de Tiago", por ter nadado duas vezes até às boias (marcação que define a zona de banhos), juntamente com o "remoinho do rio", podem ter causado o afogamento.
Inconsoláveis, os amigos de Tiago só abandonaram o local depois de o corpo ter sido retirado. Na memória ficará sempre o amigo "sociável e superdado".