Defesa tentou afastar procuradora das diligências, mas MP recusou. Primeira sessão foi há mais de dois anos. Hacker começa amanhã a responder a questões.
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A defesa de Rui Pinto, criador assumido da plataforma Football Leaks, entrou com uma queixa no Tribunal Europeu dos Direitos Humanos (TEDH), por considerar que a recusa do Ministério Público em afastar do processo a procuradora presente na sala de audiências, Marta Viegas, põe em causa o direito do arguido a um julgamento justo, equitativo e imparcial, apurou o JN.
Em causa está o facto de a magistrada ter reunido com inspetores da Polícia Judiciária (PJ) arrolados como testemunhas pela acusação e pela defesa para, segundo um email divulgado em tribunal, "afinar a estratégia de inquirição". A entrega da queixa no TEDH foi confirmada, ao JN, pelo advogado do hacker autointitulado denunciante, Francisco Teixeira da Mota, e não implica a suspensão do julgamento em curso, há mais de dois anos, em Lisboa. Amanhã, Rui Pinto, de 33 anos, começa a responder às questões do tribunal.
A polémica surgiu em abril passado, quando dois inspetores da PJ que já tinham testemunhado no julgamento - Aida Freitas e Hugo Monteiro - regressaram a tribunal para que as suas declarações fossem, face a contradições flagrantes, confrontadas. Aida Freitas apresentou então um email no qual se lia que o coordenador da investigação na Judiciária, José Amador, tinha convocado os colegas para uma reunião com a procuradora Marta Viegas, no dia 8 de setembro de 2020 - quatro dias após o início do julgamento.
outros recursos esgotados
A defesa do advogado Aníbal Pinto - de 61 anos e acusado pelo MP de, em coautoria com Rui Pinto, ter tentado extorquir, em 2015, o fundo de investimento Doyen Sports - foi o primeiro a pedir o afastamento da magistrada. O requerimento foi, mais tarde, acompanhado por Teixeira da Mota. O MP não lhes deu razão, por ter sido ultrapassado o prazo para a contestação, e, sem outras instâncias nacionais às quais recorrer, a defesa de Rui Pinto decidiu apelar diretamente ao TEDH. Não é certo que a decisão seja proferida antes do fim do julgamento em Lisboa, que está já na sua reta final.
Rui Pinto está acusado, no total, de 90 crimes, 89 dos quais informáticos e relacionados com ataques, entre 2015 e 2019, ao Sporting, à Doyen Sports, à Federação Portuguesa de Futebol, à Procuradoria-Geral da República e à sociedade de advogados PLMJ. O 90.º ilícito é a tentativa de extorsão.
No início do julgamento, a 4 de setembro de 2020, o pirata informático falou pela primeira vez, mas apenas para dizer que tudo o que fez foi por "um bem maior". Seguiu-se a audição de dezenas de testemunhas.
Um diferendo que só o Tribunal da Relação de Lisboa solucionou sobre se o criador do Football Leaks poderia consultar um dos discos que lhe foram apreendidos - e que este ganhou - atrasou mais o julgamento. Rui Pinto condicionou sempre o seu depoimento em tribunal à consulta desse disco.
Processo
Detido na Hungria
Rui Pinto foi detido em janeiro de 2019 na Hungria, no âmbito de um mandado de detenção europeu. Foi extraditado para Portugal em março seguinte. Ficou em prisão preventiva.
Aceitou colaborar
Depois de mais de um ano na cadeia da PJ, o arguido aceitou começar a colaborar com esta Polícia e passou, em abril de 2020, para prisão domiciliária. Quatro meses depois, foi libertado.
Proteção policial
O criador do Football Leaks está inserido no programa de proteção de testemunhas. Desde o início que o julgamento tem decorrido com segurança adicional.
500 mil euros, no mínimo, foi quanto, segundo a acusação, Aníbal Pinto e Rui Pinto terão tentado extorquir à Doyen Sports, em 2015, para que as publicações sobre este fundo no Football Leaks parassem. Os arguidos negam.
24.078 euros de indemnização são exigidos por três advogados cujas caixas de email terão sido invadidas e copiadas por Rui Pinto. Os causídicos, assistentes no processo, trabalhavam, à data, na PLMJ e pretendem doar o valor a instituições sociais.