Uma ativista argentina e uma investigadora brasileira juntam-se ao leque de acusações feitas ao sociólogo Boaventura de Sousa Santos, um dos visados num livro internacional sobre má conduta sexual na academia e publicado na prestigiada editora académica "Routledge". Moira Ivana Millan afirmou, num vídeo publicado a 10 de junho do ano passado, que foi alvo de assédio sexual por parte do diretor emérito do Centro de Estudos Sociais (CES) da Universidade de Coimbra.
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"Em 2010, viajei até Portugal, até Coimbra, a convite dele [Boaventura de Sousa Santos] para dar uma aula de pós-graduação e esse senhor convidou-me para jantar, num local onde estávamos sozinhos, e depois, começou a beber. Disse-me que podíamos ir ao departamento dele buscar uns livros para ele me emprestar. Quando fui ao departamento desse senhor, ele atirou-se para cima de mim", disse Moira Ivana Millan, ativista argentina e mapuche que luta pela recuperação de terras indígenas.
Num livro publicado a 31 de março, três investigadoras de nacionalidade belga, portuguesa e norte-americana dão conta, no último capítulo, de condutas sexuais inapropriadas numa instituição. Apesar de não ser nomeada, pode ser identificada como o CES, a instituição em comum no percurso das autoras.
Também os visados pelas acusações não são mencionados. No entanto, podem ser facilmente atribuíveis a Boaventura de Sousa Santos e ao investigador do CES Bruno Sena Martins. Ambos negaram as situações narradas no livro, que apontam que os dois homens usaram o seu poder sobre jovens mulheres para "extrativismo sexual".
Numa carta aberta enviada a todos os investigadores do CES, e a que o JN teve acesso, o sociólogo disse estar a ser alvo de uma "difamação anónima, vergonhosa e vil". O diretor emérito do CES anunciou ainda que vai avançar com uma queixa-crime contra as três investigadoras. Já Bruno Sena Martins afirmou à Lusa que se tratam de "insinuações fantasiosas".
"Ninguém vai acreditar"
As declarações de Moira Ivana Millan estão publicadas num vídeo na conta de Instagram "Movimento Mulheres e Diversidades Indígenas para o Bem Viver" e remontam a 10 de junho do ano passado. A ativista de nacionalidade argentina explica que foi aconselhada por um compatriota a não denunciar a situação ocorrida com Boaventura de Sousa Santos. "Um argentino alojou-me em Lisboa quando voltei de Coimbra, destroçada com o que tinha acontecido, por sentir o racismo e o patriarcado à flor da pele, por causa da atitude que ele tinha tido. Esse argentino disse-me: 'Moira, não diga nada. Ele é a esquerda em Portugal. E, na Argentina, ninguém vai acreditar, porque ele é como um guru do pensamento da esquerda'".
Outra investigadora, de nacionalidade brasileira, confirmou ao jornal "Público" que é uma das alegadas vítimas também apontadas na obra escrita pelas três investigadoras. O caso passou-se há quase dez anos: a investigadora acusa Boaventura de Sousa Santos, na altura o seu orientador de doutoramento, de lhe ter tocado no joelho e de a ter convidado a "aprofundar a relação", como forma de "pagamento" pelo apoio académico do sociólogo. "O assédio que era sexual tornou-se [assédio] moral", com o diretor emérito do CES a criticar alegadamente "de forma muito agressiva" o trabalho da investigadora e do companheiro, ambos a trabalhar no CES.
O JN não conseguiu, até ao momento, falar com o Boaventura de Sousa Santos.