Mário Soares considera que o Governo "de algum modo ignorou a crise global", o que considera ter sido "grave" para o país, num livro que é lançado, quinta-feira, e reúne artigos de opinião do antigo Presidente da República.
Corpo do artigo
No livro "No Centro do Furacão - Reflexões Sobre a Europa e Portugal em Tempo de Mudança", que é hoje lançado, Mário Soares reúne artigos publicados nos últimos meses no jornal Diário de Notícias e na revista Visão e uma conferência que protagonizou em Paris com o título "Portugal e a Europa: Do fim da ditadura aos dias de hoje".
No entanto, o antigo chefe de Estado junta à obra um texto de abertura e uma nota final originais, escritos em Fevereiro e Abril deste ano, respectivamente.
No primeiro, Soares afirma que a "política, os políticos e os partidos estão num caminho de descrédito progressivo", antes de sublinhar que o Governo de José Sócrates "tardou a reconhecer a crise global" que se adivinhava antes de 2008.
"Esse atraso do Governo, que, de algum modo ignorou a crise global, foi grave para Portugal. Note-se, porém, que não fomos um caso único na União Europeia. Bem pelo contrário", afirma Mário Soares.
Contudo, o antigo Presidente da República reconhece que o primeiro-ministro, já este ano, tem-se "esforçado por tapar buracos", com "rara determinação", mas aponta-lhe uma "falha enorme": "Mas os portugueses não foram suficientemente informados sobre o que se conseguiu e como se conseguiu, nem nunca se delineou, que eu saiba, um plano de conjunto, debatido e aceite pela maioria, para sair da crise".
Mas as críticas à União Europeia na forma como lidou com a crise global prosseguem mais à frente: "fechou os olhos às causas da crise e deixou impunes os seus responsáveis directos, com raras excepções".
Por outro lado, Soares alerta que as políticas de austeridade que têm sido adoptadas podem vir a ter repercussões "muito negativas no domínio económico e social", podendo mesmo "não reduzir ou até aumentar o desemprego".
"Se o Fundo Económico e Financeiro que prometeram criar e o Banco Central Europeu não tiverem atenção à necessidade imperiosa de evitar a recessão, deixando crescer a economia, a União Europeia - incluindo os imigrantes que acolhe - entrará em grande ebulição social", avisa o fundador do PS e também antigo primeiro-ministro.
No texto de abertura, Soares afirma que na União Europeia "há um estado que manda", a Alemanha, "e todos os outros obedecem", nos momentos cruciais.
"A União Europeia não pode deixar germanizar-se", critica.
Na nota final, com a data de 11 de Abril, o antigo Presidente da República diz que José Sócrates "teve de, em nome do superior interesse nacional, ajoelhar perante as medidas de austeridade impostas por Bruxelas e pelo FMI [...]", referindo-se ao PEC IV.
Sobre a campanha eleitoral das legislativas, Mário Soares teme que os partidos "agravem a crispação política presente, em vez de se porem de acordo sobre como salvar o país".
O livro é lançado hoje ao final da tarde no Museu do Oriente e será apresentado por Artur Santos Silva.